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14 de julho de 2020

Linda do Rosário - E outras histórias de amor


Já faz algum tempo que eu queria escrever sobre a obra - A linda do Rosário,  de Adriana Varejão em exposição no Museu de Inhotim - MG. A obra de 2004, retrata em sua forma os últimos momentos de um casal. Aliás, supostos amantes, que se encontravam frequentemente no Hotel Linda do Rosário, localizado no centro do Rio de Janeiro. Lembro bem da notícia, quando passou na TV. O hotel veio abaixo e todos conseguiram sair antes do desabamento, porém, um casal permaneceu no quarto e acabaram morrendo juntos. Dizem que ali, entre alicerces e tijolos, foram encontrados abraçados e despidos. Se é verdade, eu não sei, mas sei que da história nasceu a arte. Num remonte de parede, os escombros se juntam às partes vitais do corpo humano, formando assim, um só corpo artístico.

 
A obra de Adriana Varejão, que também foi lembrada na música do grupo Los Hermanos, Conversas de botas batidas, trouxe de volta à vida esse casal de amantes, e tão logo, me fez recordar de histórias de amantes que são clássicos na história, na literatura e na vida como um todo.  Há quem diga, que tanto a mulher como o homem que se encontravam neste hotel, eram casados com outras pessoas e depois de longos anos distantes, se reencontraram e deram continuidade ao romance, agora, como amantes. Um amor proibido...

Amores proibidos estão constantemente marcando sua presença na literatura. Podemos citar aqui o lendário romance de Lancelot e Guinevere descrito nos livros sobre o Rei Arthur, Francesca e Paolo que surgem no canto V do livro Inferno, o terceiro de Dante na saga A Divina Comédia. E talvez esses amores impossíveis, porém, tão bem registrados com sua magnitude de sentimentos, faz com que alguém lendo, possa olhar para a sua própria vida e achar que dentro de um relacionamento de rotina, viver um romance proibido seja, por fim, algo que lhe dê novamente animo para que seus dias passem a ser mais valorosos. Ou mesmo não. É provável também que se assuma o risco por se querer, sem influências, sem culpas lançadas a outros. São tantas também as várias histórias de romances desse viés na vida real que não se sabe quem influencia quem. Apenas sabemos que existe, é um fato. E a questão que mais me faz observar essas histórias seria qual o objeto motivador da traição? Por qual motivo ela se perpetua em todos os níveis sociais e parece chamar aquele ser carente de afeto para uma vida de riscos?

Sabemos que há muitas histórias de traições que não se alinham ao sentimento de amor proibido, e sim, aventuras interligadas apenas ao desejo do fruto proibido. Uma sensação única, como um alívio de tensão e nada mais. Logicamente não sabemos distinguir tão fácil uma situação da outra, já que apenas quem está vivendo aquele momento conhece seus verdadeiros sentimentos. Como um exemplo real, podemos citar as tantas peripécias amorosas de Dom Pedro I, que mesmo casado, viveu diversas aventuras, além de ter tido amantes fixas, como a tão famosa Domitila de Castro, por fim chamada de marquesa de Santos.

Aqui não é espaço para julgamento de tais feitos, e sim para comparar a vida e a arte, que de um modo geral se encontram, se completam e por diversas vezes acabam tendo o mesmo fim. Aliás, os desastres e tragédias que acompanham essas histórias, parecem estar interligados ao desejo do que é proibido, tendo como consequência sempre algo nada bom para os envolvidos. O questionamento então vem a ser as razões pelas quais, mesmo sabendo que é errado, que há outra pessoa emocionalmente envolvida, embarca-se neste delírio de ser feliz, mesmo que não dure muito. É válido correr tantos riscos em busca de algo que realmente não sabemos se vai durar ou se é apenas um capricho nosso? Eis a questão.

Sabemos apenas que arte e realidade se embatem todo o tempo, até mesmo quando não confirmada, como o tão famoso questionamento de Bentinho sobre a traição de Capitu. Também podemos citar duas pinturas famosas de René Magritte, intituladas Os Amantes (I e II), obras estas que mostram um casal com as cabeças cobertas com capuzes, indicando claramente um envolvimento amoroso que não pode ser visto. Então voltamos para a Linda do Rosário e seu casal de amantes que representariam bem este mesmo casal pintado por René, mas que no fim, com a dura tragédia, acabaram expostos não apenas por suas faces e identidades, mas sim de corpo inteiro, que nus e abraçados viveram seus últimos momentos juntos, deixando como a marca desse amor,  arte que é cantada e vista, deixando também este questionamento para ser resolvido por nós, ou apenas a vida nos deu a oportunidade sermos testemunhas desse amor que vai além da vida, e agora, se estreita e se fixa na arte.

3 comentários:

  1. Que texto! 👏🏼👏🏼👏🏼

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  2. Muito bom! Rico de conteúdo e proporciona ao leitor reflexão sobre o texto e tenha muitos sentimentos sobre o mesmo. Amei.

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